Cap 6: Oi, pequenino

 

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            Muitas pessoas estavam atravessando as pontes para chegar nessa plataforma e algumas centenas de pessoas já estavam nela, alguns deles sentados em grupos, crianças correndo e muitas pessoas preparando uma enorme fogueira. 

Na frente da árvore e acima da plataforma, ficava uma Oca especialmente grande, a altura dela era de uns 15 andares e dezenas de metros de largura.


A estrutura era feita dos galhos da árvore e por um metal prateado, as paredes externas pareciam bem espessas e eram ornadas por cristais e decorações.


“Será que é boa ideia fazer uma fogueira em cima de uma árvore?”


“Uma chama como essa não queimaria nem uma folha da grande  ihya” 


As pessoas abriam espaço para Guaracy e o grupo passar, elas olhavam com reverencia para a mãe da Cicí.


“Ni Ivití, eu melhorei muito desde o último tratamento”





“Abençoado seja os hekura”


Muitos agradeciam e outros só falavam “Ni”, Guaracy olhou para Vatu que estava logo ao lado dele e perguntou ”Elas são da família real ou algo assim?”


“Não... os “Ni” são os anciões, eles lideram a aldeia e a maioria deles são hekura”


“Esses hekura são os curandeiros?”


“Sim, mas a maior responsabilidade deles é de nos proteger dos Yamari, os Yamari são seres malignos que saem do mundo espiritual”


“Hekura é tipo um Shaman…” pensava Guaracy.


Vatu, com uma expressão de reverência, parou de falar quando eles chegaram na entrada da grande Oca, o prédio não tinha portas e o saguão de entrada tinha uns 10m de altura e dele saíam algumas escadarias, a maior delas parecia circular o prédio.  


“A reunião vai ser no terraço” disse Ni Ivití enquanto se dirigia até a maior escadaria.


Enquanto eles subiam, Guaracy notou que os galhos que formavam as paredes eram cobertas por tecidos decorados com retratos ou batalhas épicas, cristais para iluminação e inscrições de diversos formatos.


“O predio está praticamente vazio… as pessoas deve estar todas no pátio lá fora” pensava enquanto tentava entender a estrutura do prédio.


O lado de fora dava a impressão de um prédio de vários andares, mas como cada andar era bem alto e os andares eram feitos de galhos grossos, no final das contas, eles tiveram de subir só 5 andares até chegar no terraço.


 “Caramba.. como eu queria fazer uma pausa para descansar… aquilo é uma coral enorme subindo pela lateral do prédio?” 


O terraço consistia somente de um grande espaço aberto com um mesa no centro, o chão era bem nivelado apesar de ser feito dos galhos das árvores, diversos seres e pessoas comuns estavam sentados no chão formando um semicírculo e deixando livre o centro e a parte que dava no tronco.


O que mais chamava a atenção eram os diverso pássaros sentados no parapeito ou sobrevoando o prédio, dois sapos muito coloridos e uma onça enorme correndo na direção deles.






A onça parou ao lado de Ni Ivití e parecia se comunicar com a onça menor que acompanhava a Cicí, Guaracy já ia perguntar sobre isso quando ele sentiu uma coisa sentando no ombro dele.


Ele virou e viu um ser parecido com uma fada, mas ela tinha asas de borboleta e algumas partes do corpo iguais a do inseto, ela o olhou nos olhos e disse ”oi, pequenino...“





“Ola… giganta”  


Ela deu risada e voou para um dos galhos que formavam a estrutura, olhando em volta Guaracy viu uma capivara gigante deitada perto da outra entrada e nas costas dela se sentava um velhinho de barba branca.


Em uma das laterais, perto do tronco, se sentava um homem estranho cheio de cicatrizes e atrás dele estava um ser escuro com muitos olhos vermelhos.


Antes que Guaracy pudesse ver bem que ser era aquele, o tronco da árvore se contorceu e um rosto se formou, alguns segundos depois uma mulher usando uma máscara de madeira saiu do centro da árvore e tomou a posição central do salão.





Ela tinha uma pele mais clara que a dos outros, os cabelos castanhos como o tronco de uma árvore, tinha belas pinturas corporais e era bem alta, mas para Guaracy todo mundo daqui era alto.


Ela olhou em volta e disse “Saudações a todos”, a voz dela tinha um tom estranho, parecia que várias pessoas estavam falando ao mesmo tempo.


Mas o som de diversos animais e pessoas saudando de volta era ensurdecedor. ”Saudações Ni Wodàyn òwòru”


Assim como todos os outros, o grupo de Guaracy escolheu uma parte livre do pátio para se sentar.


Ela esperou que eles se acalmassem e disse calmamente ” Como previsto... Ñyata nos trouxe uma grande surpresa...” o som das folhas acompanhavam cada palavra que ela falava.


Ni Wodàyn olhou para Cicí e disse “ Até o momento, é uma boa surpresa… ” e olhando para Guaracy ”Mas ela talvez traga mudanças indesejadas…” 



Ela olhou para a esquerda e disse ”Mas antes de falar sobre isso Ni Hãju gostaria de discutir alguns assuntos mais urgentes”


Ni Wodàyn andou para perto do tronco da árvore e os galhos formaram um trono para que ela se sentasse, uma mulher bem alta e  envolta em folhas, saiu da vegetação e andou até o centro do terraço.


Ela tinha cabelos verdes, das mesmas cores das folhas que cobriam boa parte do corpo dela, ela segurava um arco e com uma expressão de cansaço disse  ” Os Caiarí foram vistos novamente nos nossos campos de caça a leste do rio, nas últimas semanas eles…”

 




Enquanto ela relatava os problemas, Guaracy se virou para Cicí e perguntou “Essa tal de Ni Wodàyn é rainha ou algo assim?”


Cicí disse “ Eu não sei o que significa rainha, mas ela é a Ni mais antiga e também a mais poderosa, o conselho dos Ni toma as decisões por votação, mas com certeza a voz dela pesa mais do a dos outros…”


”Ela não parece velha...” Pensou guaracy enquanto Cicí dizia “Logicamente que os problemas menores são resolvidos pelas pessoas que trabalham aqui neste prédio e nos outros espalhados pela aldeia.” 


“E a Ñyata é a deusa de vocês?”


Cicí disse “ Eu também não sei o que significa deusa…  Ñyata é o espírito da floresta” 


Depois de relatar brevemente os acontecidos, Ni Hãju e alguns outros saíram para reforçar os posto de guarda da aldeia, Ni Wodàyn se levantou e voltou para o centro. 


“o último grupo que mandamos para investigar o assunto, foi descoberto e caçado por dias...”


“Entretanto, Ñyata nos favoreceu novamente… pouco tempo atrás, nós resgatamos a última que faltava… Cicí venha a frente!”   


 Cicí andou até ao lado de Ni Wodàyn ”Durante a luta o grupo acabou se separando, eu fui perseguida pelos Caiarí durante várias horas, mas eles não tiveram a coragem de me perseguir durante a noite” 


Era possível ver apreensão nos rostos dos outros Ni, um deles perguntou “Como você conseguiu sobreviver? a lua não estava visível na noite passada” 


“Durante a fuga eles fizeram de tudo para que eu não conseguisse voltar para cá, mesmo se o meu estoque de amuletos não estivesse baixo eu não iria sobreviver, fora de uma aldeia... mas a única aldeia próxima, era a dos Kurowas”.


“Eu corri o mais rápido que pude, mas eu não podia gastar o resto do meu Uzenu, eu definitivamente não queria ser corrompida pelos Yamari e vagar pela eternidade, mas com certeza eu iria precisar de Uzenu para evitar ser devorada pelos Kurowas...“


“As sombras começaram a se distorcer antes mesmo do último raio de luz deixar de banhar as copas das árvores, um silêncio aterrador cobria a floresta” 


“Todos os animais tinham se escondido, nem os loucos dos Kurowas tinham a coragem de olhar para as sombras, eu não conseguiria expor o alívio que eu senti quando vi as luzes das fogueiras.”


“Dali em diante eu não poderia fazer som algum, eu usei alguns amuletos para aumentar a minha velocidade, sentidos e um para me camuflar, a fogueira mais próxima tinha muitos sentinelas, eu não tive escolha a não ser correr como uma louca até a próxima fogueira”


“Mesmo com os sentidos aumentados era muito difícil se se guiar sem a lua, mas eu conseguia ver vultos monstruosos se movendo pela mata, eu os sentia se aproximando....”.





“Eu estava tão agitada que demorei para perceber os olhos vermelhos na minha frente...um Yamari enorme estava bloqueando o meu caminho, eu não parei de correr por um segundo… ele já ia me abraçar com os seus tentáculos quando eu usei a árvore ao lado para pular por cima dele”


 “O barulho era a última coisa que me preocupava, eu já estava preparada para uma luta até a morte pela posse do totem, eu pulei pela cerca diretamente no campo deles e subi em cima do totem antes que Pü e os outros pudesse reagir”


“Eu olhei para os Três e disse ‘se vocês me atacarem ou chamar por ajuda eu vou destruir esse totem e nós todos vamos virar espectros…”


Um dos Ni, que estava sentado ao lado de um réptil não resistiu e perguntou ”Eles te deram ouvidos?...”


“Quieto!! não atrapalha a história…” disse outro.

 

“Normalmente eles não iriam… mas quando eles olharam para as sombras e viram a quantidade de Yamaris que eu tinha atraído... eu tive que passar a noite em claro vigiando eles e escutando todo tipo de insulto sobre como esse tipo de luta não era honrada…”


“Eu tive que usar os meus últimos cristais de Uzenu para conseguir passar a noite mantendo a transformação, então um pouco antes de amanhecer eu tive que correr como louca novamente...”





“Alguns Yamaris ainda estavam espreitando o nosso totem, quando eu corri eu dei de cara com dois deles… ainda bem que a minha mãe tinha preparado alguns amuletos de selamento e de purificação, não sobrou um sequer quando o sol apareceu…”


“Quanto eu encontrei o Guaracy eu não tinha mais Uzenu sobrando para a transformação e pensei que fosse um dos Kurowas, eu estava exausta, mas não ia cair na mão deles sem lutar... “


Nessa hora vários deles começaram a olhar para Guaracy, “o resto da história vocês já sabem... ele estava perdido e por acaso decidiu me ajudar…”


“Merda! nao fala desse jeito, vai parecer que eu te ajudei para me infiltrar..” pensou Guaracy antes de levantar e dizer ”Eu realmente não sei como eu vim parar aqui! eu não sou um ESPIÃO!...”


“Não se preocupe pequenino... nós sabemos disso” disse a Ni que se parecia com uma fada “Vatu e os outros que você encontrou ainda são muito pequenos, eles mal começaram a enxergar….  mas para nós do conselho, as suas emoções e intenções são muito claras…”


Ni Wodàyn òwòru olhou para ele e disse “Vamos ver se Ñyata nos revela de onde você vem…” Ela arrancou um fio de cabelo de Guaracy e se aproximou da mesa que ficava no centro do terraço.


Assim que ela pôs, a mão que estava com o fio de cabelo, na mesa as runas começaram a se acender, primeiro as da mesa e depois as de todo o andar.


As folhas das árvores começaram a se mover, o som do vento parecia passar algum tipo de informação, o fenômeno só durou alguns, mas Guaracy conseguia ver uma expressão de surpresa em quase todos, só o Ni velhinho, aquele que estava em cima da capivara começou a rir.


Ni Wodàyn òwòru com um olhar estranho disse ”Tudo no nosso mundo está coberto por Uzenu… nós sabíamos o destino da Cicí, o inesperado é que Ñyata iria trazer alguém de outro mundo para ajuda lá…”


“Você está me dizendo que ela me trouxe aqui simplesmente para ajudar a Cicí?”


Ni Ivití olhou para ele e falou “Sim e não… você já estava vindo, agora o local exato ou o porquê de você vir nós não sabemos, a linha do seu destino tinha se quebrado com a viagem... Ñyata sentiu você passando pela floresta bem na hora que ela ia intervir para salvar a Cicí… ela decidiu que ao invés de te deixar morrer aleatoriamente na floresta, você bem que poderia ser de uma pequena ajuda para Cicí” 


“-_- … Você poderia perguntar para ela o por que eu vim para esse mundo?”


“Ela também não sabe… mas veja pelo lado bom!... você poderia ter aparecido em um local distante e sobrevivido só por algumas horas, ou ter aparecido diretamente na aldeia dos Kurowas” disse o velhinho da capivara.


Ni Wodàyn olhou para ele e disse “a questão mais importante  agora é qual vai ser o seu destino daqui para frente..”


“Que tal aceitá lo na tribo? ele não tem para onde ir mesmo” disse Cicí.


“Ele veio de outro mundo.. a mera presença dele na nossa tribo, pode atrair muitos problemas“ disse o Ni sentado ao lado do inseto negro”.


“O destino dele já está ligado ao nosso..” disse Ni Ivití.


Outro NI se levantou e disse “Se formos aceitá lo na tribo, o correto seria seguir as regras e sondar as memórias dele, não podemos deixar um monstro entrar na nossa família”.


Cicí não aguentou e disse “Eu não acho isso justo.. além dele ter me ajudado, foi Ñyata que o trouxe para perto da nossa tribo ”


 “Cicí você conhece as regras e Ñyata o colocou em seu caminho por aquele momento, mas não sabemos nada além disso” disse outro Ni.


 “Isso pode ser um problema... as últimas semanas foram um pouco...” Pensou Guaracy.


Ni Wodàyn disse “Nós temos pouco tempo, as preparações de hoje a noite estão quase prontas… sente se Guaracy, eu só vou olhar alguns pontos chave da sua memória, para poder entender a sua personalidade e ver se você pode entrar na nossa família… e talvez isso te ajude a descobrir como você veio parar aqui ”


“Tudo bem, eu só quero deixar uma coisa clara, eu não concordo com o modo que as pessoas do meu país tratam as florestas...” 


Ela pegou um pequeno pote e andou até Guaracy, “O que ela vai fazer com essa tinta?” pensou ele quando ela abriu o pote e mergulhou o dedo indicador na tinta vermelha.


Ela usou os dedos para pintar algumas runas no rosto dele,  alguns segundos após terminar as runas ela tocou a runa que ficava na testa dele e disse algumas palavras que Guaracy não entendeu.


Guaracy não teve tempo de entender a cerimônia, pois logo em seguida ele se viu revivendo uma memória que ele nem se lembrava mais.


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